1.8.12

Ingredientes do Peru II - Mercado de Cuzco





Vamos começar pelo clichê: o mercado de Cuzco é um mundo de sabores e cores, a gente não sabe para que lado olha. O olfato também não deixa de trabalhar, aliás. Há sujeira e pobreza, mas há também fartura, riqueza cultural, ingredientes locais. Aliás, o que mais me impressionou no mercado de Cuzco é que a maioria dos produtos vendidos ali são produzidos no país, na região e, quando processados, são artesanais, caso do pão e do queijo. Em todo o Peru é possível constatar, seja nos restaurantes mais chiques ou nas biroscas mais populares, que a comida servida é impregnada de latinidade, de peruanismo, de tudo o que se vê percorrendo o país pelo interior. O que vi - e compartilhei - as cholas comendo sentadas numa praça de uma pequena vila entre Cuzco e Puno nada mais era do que os mesmos ingredientes que comia nos restaurantes estrelados à noite, porém, preparados de forma tradicional, à moda antiga. Milhos, batatas, pimientos são a base desta culinária - veja a extensão da barraca de batatas no mercado, e a variedade de papas que ela oferece; assim também acontece com os milhos, que são vendidos em várias cores e tamanhos, frescos, secos, choclos. A rã boiando na bacia estava à venda para ser batida no liquidificador ainda viva, ali mesmo, e esta "vitamina de rã", digamos, era oferecida aos fregueses a preços baratinhos.   Serve para garantir virilidade, por supuesto. Já estes pães enormes são preparados com farinha de milho por mulheres que vivem próximo a Cuzco, e a procura por eles é grande. Garantimos o nosso, gostei, é comida para um batalhão. Continua...

Ingredientes do Peru I




Um pouco do Peru, em imagens sacadas no mercado de Cuzco. De cima para baixo: primeiro, um milho negro, uma das centenas de espécies deste cereal que os peruanos cultivam. Depois, ao meio, um queijo amarelo curado e, o que me pareceu mais impressionante, por último, papas blancas. São batatas expostas à água gelada dos rios e lagos durante um ou dois meses, até que se tornam secas, consumíveis em qualquer tempo. Trata-se de uma maneira de driblar a escassez e/ou a deterioração natural do ingrediente. Os tipos de papas, batatas, são centenas no Peru. A riqueza culinária do país é impressionante e vai merecer ainda alguns posts aqui, desta Anastácia.

12.4.12

Costelão do Cadeg






Este Anastácia já tinha falado sobre o Cadeg em outro post, antiiiigo, mas era específico sobre a Festa Portuguesa - assim mesmo, com letras maiúsculas - e suas delicinhas gastronômicas. Posso dizer que sou uma frequentadora do Cadeg, no bairro de Benfica, mas nunca tinha ido ao Costelão - o estabelecimento é novo, foi aberto há pouco mais de um ano. Mas como o assunto tem se espalhado, e ouvi algumas pessoas falando bem da tal costela, resolvemos provar dia desses. Saborosa, tem bom tempero. Farta. No entanto, a farofa não é digna de nota, e muito menos o serviço - desorganizado e lento. O chope é Devassa e nos foi servido quente todas as vezes. Mudamos para a cerveja e, de novo, quente. A julgar por estas observações, não vale a visita. Uma vez no Cadeg, vá ao vizinho do Costelão, o restaurante Barsa. Mais isto é outra história. 

11.4.12

Brasserie Rosário





Dia desses fui resolver pendências no Centro do Rio e aproveitei para tomar um café na Brasserie Rosário, e então percebi que nunca tinha falado dela aqui no blog, apesar de já tê-la frequentado algumas vezes. A casa, em pleno Rio Antigo, produz pães e doces de confeitaria deliciosos, tem mesinhas charmosas na rua -- fechada para carros -- e um ambiente de móveis de madeira aconchegante, apesar do pé direito alto. Lá dentro, um restaurante sobre o qual não posso opinar, já que nunca provei dos pratos anunciados na tabuleta de giz. Mas o lugar vale a visita, principalmente, por estar onde está. A Rua do Rosário é uma graça, com seus sobradinhos coloniais reformados e bem cuidados. Além disso, o sobrado no qual está instalada a Brasserie servia como sede da Tesouraria do Império, nos tempos de D. João VI.

Brasserie Rosário

10.4.12

Azeite de manjericão

O primeiro azeite a gente nunca esquece. É a coisa mais simples do mundo: um vidro de azeite extravirgem, pimenta dedo de moça inteira, ramos de manjericão fresco. Pronto. Geladeira. Quinze dias depois, provei um azeite delicioso, levemente apimentado e com sabor de manjericão. Comentei sobre minha aventura com o chef Gennaro Cannone, do Alessandro&Frederico, e ele aprovou, disse que o caminho é este mesmo. Dica: eu não furei, amassei ou cortei as pimentas, coloquei-as inteiras, para que não ficasse muito forte. E não é preciso ferver nem colocar sal. É só isso mesmo. Pode levar fé.

Do Horto: você vai me agradecer












Ele se chama bar Do Horto, fica no bairro de mesmo nome e tem o melhor - e talvez único? - pastel de bobó de camarão da cidade. O creminho gostoso de aipim, a massa sequinha e a generosa porção de camarão que compõem esta belezura são sua receita de sucesso - total e garantido. Antes, funcionava no mesmo sobrado de esquina da Pacheco Leão um barzinho de outro nome, o Da Graça. O nome mudou, mas o lugar continua agradável - fica em frente ao Jardim Botânico, numa rua arborizada e de pouco de movimento - e as comidinhas melhoraram. Provamos também a porção de linguiça de cordeiro com geléia de menta, que estava saborosa, mas não melhor que os pastéis. Sente ali na calçada, peça uma caipirinha ou uma cerveja Therezópolis - ou quem sabe as duas ao mesmo tempo, como eu fiz - e jogue conversa fora. Depois aproveite para dar uma volta pelo bairro, que é um charme só. E fique relax. Você vai me agradecer.

Do Horto
Rua Pacheco Leão, 780



27.3.12


Dei uma entrevista ao site Les Brasileiros, escrito por uma jornalista francesa que mora no Brasil, a Laurence. O site é bem interessante, fala sobre o Brasil e os brasileiros de maneira diferente, com matérias que explicam, por exemplo, o que é o "chá de panela", "a história do açaí", "o mercado de motéis no Brasil"...  Curioso. A moça entrou em contato comigo porque tinha leu meu livro e adorou. Convidei-a para vir aqui em casa, tomamos café, provamos uma torta de banana que fiz com uma receita do livro Dona Benta e caímos na conversa. Teretetê, teretetê, tricô, tricô, foi uma delícia. Depois, Laurence transformou tudo em um ping-pong resumido e publicou aqui. Mas ainda melhor que conversar sobre comida de rua e tal, coisas sobre as quais adoro falar, foi saber da própria Laurence suas impressões gastronômicas e culinárias do Brasil. Ouvi coisas como "nunca vi um país onde as pessoas comem tanto", "aqui tem lugar para comer qualquer coisa, a qualquer hora, em qualquer rua...", "vocês brasileiros não têm hora para comer. Na França ninguém passa o dia beliscando", "os pratos são muito grandes, as porções para dois geralmente servem quatro pessoas". E a parte chata: "Aqui é absurdamente caro, e às vezes muito mais do que em Paris". É, pessoal, do jeito que a coisa vai, vamos acabar gordos e pobres. Ou não... (em homenagem ao querido Chico Anysio).

5.3.12

Moça bonita não paga






As fotos são de uma feira nos arredores de Paris. Antiiiiiigas... De 2005. Servem apenas para ilustrar a letra da canção que descobri na semana passada (valeu a dica, Ivan Accioly!): "Moça bonita não paga", do compositor Ratinho, morto no ano passado - e autor também de, entre outras, da famosérrima "Vai vadiar", com Monarco. Enfim, a letra do samba de 1982 da Caprichosos de Pilares fala sobre feiras e mercados, e é muito fofa.
PS.: Encontrei a letra aqui.

"Moça bonita não paga"

Vamos homenagear (Vamos homenagear)
A feira livre e o mercado popular (E o dito popular )
Quando vem o amanhecer
Um pouco antes do sol nascer
A feira livre está pronta
E nela desponta a cabrocha Lili
Fazendo o florista sorrir
E o vendedor ambulante
Dizer coisa interessante
Quando passa por ali (Lá vai Lili )


Vai seguindo seu caminho
Mas seu semblante se modifica
A flor se fere no espinho
Da inflação que se agita
O vendedor de laranja grita
Moça bonita aqui não paga
Pisa na casca de banana escorrega
Aqui não paga mas também não leva

Compra peixe Lili, compra peixe Lili)
Já é meio dia de bolsa vazia não pode sair) BIS

Tem zoeira, tem zoeira)
Hora de xepa é final de feira) BIS

2.3.12

Galeto Liceu



Desci na estação Carioca do metrô e dei de cara com o Galeto Liceu, cuja placa em frente, gigantesca e fora de proporção, além de "matar" a fachada do belíssimo edifcio art decó no qual está instalado o Liceu Literário Português, ainda me mata qualquer vontade de entrar no lugar. Chega a ser irritante passear pelo Centro do Rio de Janeiro e perceber que a poluição visual do comércio acaba com o charme de qualquer arquitetura. Enfim, deixemos para lá. O importante é que tive curiosidade suficiente para olhar por cima da porta camarão do Galeto Liceu e descobrir um lugar interessantíssimo. Entrei sem pensar duas vezes. Inaugurado em 1943, tudo ali parece parado no tempo. Depois, em casa, li um texto de Juarez Becoza sobre o lugar. Faço minhas as palavras dele. Apenas acrescento uma observação: o galeto do Liceu é delicioso, mas ainda precisa subir alguns degraus para chegar aos pés do Sat's. Sobre o arroz e a farofa, teco o mesmo comentário. Bom, no Liceu, só provei o galeto, mas todas as carnes que passavam por mim pareciam apetitosas e macias. Ao meu lado, um cliente traçava um bife qualquer que me deixou babando. De primeira. E rápido, com atendimento impecável. Só não espere conforto: não há mesas, apenas bancos acolchoados no lindo balcão de madeira.     

Galeto Liceu
Rua Sen Dantas, 118, Centro, Rio de Janeiro
21-2220-6045

28.2.12

Seu Fuad, sua picanha macia e os boêmios de ontem e hoje






Seu Fuad, que um amigo meu, na maior cara de pau e sem qualquer intimidade com o próprio, chama de "Fufu", é o dono de um restaurante (Esquina Grill do Fuad) forecedor de um gênero de comida que, se fosse no Rio, eu batizaria de CCC (Comida Carioca de Combate). Como é em São Paulo, podemos chamá-lo de CPC (o P é de paulista ou paulistana, obviamente). E até fica bonitinho neste caso, posto que CPC também era o combatente Centro Popular de Cultura, da UNE, e Fuad, reza a lenda, já deu de comer a muitos "subversivos" nos tempos da ditadura. José Dirceu, por exemplo, seria um deles. O restaurante do Fuad fica pertinho da Escola de Sociologia e Política - e do Mackenzie -, em Santa Cecília. Hoje, ostenta nas paredes dezenas de reportagens enquadradas sobre sua história, todas elogiando a qualidade dos pratos. É um especialista em carnes grelhadas. E são gostosas, embora as batatas e polentas não me apeteçam muito, têm aquele gosto de tempero pronto, qualquer coisa entre o ajinomoto e o sazón. Mas o lugar é agradável, por isso as batatinhas ficam em segundo plano. Peça uma picanha (deliciosa, macia) que leva o nome de "Ronaldo", em homenagem ao Fenômeno; vem acompanhada de agrião (e o que isso tem a ver com o jogador eu já não sei) e manteiga de alho, além da tal mandioca. Nas mesinhas da calçada - numa esquina arborizada - o clima é de festa, leve, e a cerveja de garrafa vem estupidamente gelada. Domingo tem fila de espera, como não poderia deixar de ser em se tratando de um bom restaurante em São Paulo. Recomendo ir à noite, durante a semana, quando o ambiente está mais próximo do original dos idos de 1968: impera a juventude boêmia, e quase não há famílias com crianças. Se encontrar o Fuad, pergunte sobre os velhos tempos.

As saudades que sinto da melhor moqueca do mundo




Já completei mais de um mês de volta ao Rio, ao fim de uma temporada paulistana de muito trabalho, e estou morrendo de saudades da Bel - minha única e querida e linda e fofucha irmãzinha -, do Soteropolitano - o restaurante no qual me sinto mais em casa do que na minha própria sala de jantar -, e, principalmente (Bel, me perdoe desta vez, mas este é um blog de culinária), da moqueca do Julinho Valverde. É a melhor moqueca de São Paulo. É a melhor do Brasil. É a melhor moqueca do mundo. E está em São Paulo, infelizmente. No Soteropolitano. Acordo no Rio de Janeiro todos os dias e penso: "Ok, vamos em frente, hoje será mais um dia sem a moqueca do Julinho". Mas não há mal que sempre dure, já disse alguém, e meu otimismo beira a alucinação. Por isso, rezo para que um dia eu possa entrar na estação General Osório do metrô, em Ipanema, e saltar na Vila Madalena. Com um cartaz nas mãos dizendo "Julinho, cadê você, eu vim aqui só pra te ver".